TRIBUTAÇÃO DE IMÓVEIS NA HOLDING

É muito comum o interesse de constituição de holding para a gestão de patrimônio imobiliário. A pessoa concentrou suas economias na aquisição de imóveis e, em determinado momento da vida, questiona se a administração desse patrimônio está correta. Seria vantajoso constituir uma pessoa jurídica? Esta e outras dúvidas eu tentei responder no meu livro Dicas para o planejamento sucessório. Defendo que a profissionalização da gestão e a harmonização dos interesses da família é organizada mais facilmente dentro de uma pessoa jurídica.

Como parcela considerável dos interessados em planejamento sucessório apresenta um patrimônio majoritariamente concentrado em bens imóveis, decidi tratar da tributação destes bens e esboçar algumas questões contábeis importantes. Num artigo escrito recentemente, destaquei a diferença da tributação entre pessoa física e pessoa jurídica, sugerindo que em muitos casos a tributação do patrimônio administrado é mais vantajosa na pessoa jurídica. Uma vez tendo optado pela constituição da holding, o passo seguinte é alocar os bens de forma adequada na contabilidade, pois esta classificação gera repercussões na apuração dos tributos.

Ao receber os bens imóveis, a holding deve registrar a propriedade na conta de ativos, podendo classificá-lo como ativo circulante ou ativo não-circulante. Assim prevê a Lei n° 6.404/76:

Art. 178. No balanço, as contas serão classificadas segundo os elementos do patrimônio que registrem, e agrupadas de modo a facilitar o conhecimento e a análise da situação financeira da companhia.

§ 1º No ativo, as contas serão dispostas em ordem decrescente de grau de liquidez dos elementos nelas registrados, nos seguintes grupos:

I – ativo circulante; e (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

II – ativo não circulante, composto por ativo realizável a longo prazo, investimentos, imobilizado e intangível. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

A ativação dos bens em cada grupo de contas deve levar em consideração a prescrição contida na Lei n° 6.404/76:

Art. 179. As contas serão classificadas do seguinte modo:

I – no ativo circulante: as disponibilidades, os direitos realizáveis no curso do exercício social subseqüente e as aplicações de recursos em despesas do exercício seguinte;

II – no ativo realizável a longo prazo: os direitos realizáveis após o término do exercício seguinte, assim como os derivados de vendas, adiantamentos ou empréstimos a sociedades coligadas ou controladas (artigo 243), diretores, acionistas ou participantes no lucro da companhia, que não constituírem negócios usuais na exploração do objeto da companhia;

III – em investimentos: as participações permanentes em outras sociedades e os direitos de qualquer natureza, não classificáveis no ativo circulante, e que não se destinem à manutenção da atividade da companhia ou da empresa;

IV – no ativo imobilizado: os direitos que tenham por objeto bens corpóreos destinados à manutenção das atividades da companhia ou da empresa ou exercidos com essa finalidade, inclusive os decorrentes de operações que transfiram à companhia os benefícios, riscos e controle desses bens; (Redação dada pela Lei nº 11.638,de 2007)

V – (Revogado pela Lei nº 11.941, de 2009)

VI – no intangível: os direitos que tenham por objeto bens incorpóreos destinados à manutenção da companhia ou exercidos com essa finalidade, inclusive o fundo de comércio adquirido. (Incluído pela Lei nº 11.638,de 2007)

Parágrafo único. Na companhia em que o ciclo operacional da empresa tiver duração maior que o exercício social, a classificação no circulante ou longo prazo terá por base o prazo desse ciclo.

Assim, se a holding envolver, por exemplo, um imóvel que foi adquirido para ser vendido dentro do exercício, a classificação é “ativo circulante”. Se, por outro lado, o imóvel adquirido foi adquirido, mas não há perspectiva de alienação no exercício, este bem deve ser apropriado na conta “ativo circulante – investimentos”. De outro modo, se o bem adquirido é a sede da empresa ou residência de algum sócio, este ativo deve ser classificado como “imobilizado”. Esta classificação segue inclusive a orientação do Comitê de Pronunciamento Contábil (CPC) n° 27 e também o Pronunciamento Técnico CPC 28 – Propriedades para Investimento.

Qual a consequência desta distinção? A consequência é que a alienação de bens do ativo circulante se beneficia da alíquota reduzida do IRPJ e CSLL, consoante estabelecem os arts. 15 e 20 da Lei nº 9.249, de 1995. A presunção geral de 8% para o IRPJ e de 12% para a CSLL e presunções específicas para algumas atividades destacadas também está regulamentada na Instrução Normativa RFB nº 1.700, de 14 de março de 2017. Por outro lado, se a alienação recair sobre bem classificado como ativo não circulante, deve-se aplicar a disciplina a tributação do ganho de capital, conforme dispõe o § 1º do art. 25 da Lei nº 9.430, de 1996, e arts. 11 e 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977.

Esta distinção gera repercussões tributárias muitas vezes não alertada aos contribuintes e, não raras vezes, enseja muitas dores de cabeça. Uma solução encontrada por alguns profissionais foi a devolução do bem do ativo imobilizado para o sócio de modo sem alteração do valor do registro contábil para que a venda seja realizada pela pessoa física e assim reduzir o percentual da tributação.

No entanto, essa controvérsia pode chegar ao fim. A Receita Federal exarou Solução de Consulta COSIT n° 07 em 4 de março de 2021 que traz um alento para os contribuintes que se utilizam de holding patrimonial como forma de gestão de imóveis. Vale transcrever a ementa da solução de consulta:

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ

LUCRO PRESUMIDO. ATIVIDADE IMOBILIÁRIA. VENDA DE IMÓVEIS. IMOBILIZADO. INVESTIMENTO. RECEITA BRUTA. GANHO DE CAPITAL.

Para fins de determinação da base de cálculo do IRPJ, a receita bruta auferida por meio da exploração de atividade imobiliária relativa à compra e venda de imóveis próprios submete-se ao percentual de presunção de 8% (oito por cento).

Essa forma de tributação subsiste ainda que os imóveis vendidos tenham sido utilizados anteriormente para locação a terceiros, se essa atividade constituir objeto da pessoa jurídica, hipótese em que as receitas dela decorrente compõem o resultado operacional e a receita bruta da pessoa jurídica.

A receita decorrente da alienação de bens do ativo não circulante, ainda que reclassificados para o ativo circulante com a intenção de venda, deve ser objeto de apuração de ganho de capital que, por sua vez, deve ser acrescido à base de cálculo do IRPJ na hipótese em que essa atividade não constitui objeto pessoa jurídica, não compõe o resultado operacional da empresa nem a sua receita bruta.

Dispositivos Legais: Lei nº 6.404, de 1976, art. 179, IV; Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, arts. 11 e 12; Lei nº 9.430, de 1996, art. 25; Instrução Normativa RFB nº 1.700, de 2017, arts. 26, 33, § 1º, II, ‘c’, e IV, ‘c’, e 215, caput e § 14.

Assunto: Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL

RESULTADO PRESUMIDO. ATIVIDADE IMOBILIÁRIA. VENDA DE IMÓVEIS. IMOBILIZADO. INVESTIMENTO. RECEITA BRUTA. GANHO DE CAPITAL.

Para fins de determinação da base de cálculo da CSLL, a receita bruta auferida por meio da exploração de atividade imobiliária relativa à compra e venda de imóveis próprios submete-se ao percentual de presunção de 12% (doze por cento).

Essa forma de tributação subsiste ainda que os imóveis vendidos tenham sido utilizados anteriormente para locação a terceiros se essa atividade constituir objeto da pessoa jurídica, hipótese em que as receitas dela decorrente compõem o resultado operacional e a receita bruta da pessoa jurídica.

A receita decorrente da alienação de bens do ativo não circulante, ainda que reclassificados para o ativo circulante com a intenção de venda, deve ser objeto de apuração de ganho de capital que, por sua vez, deve ser acrescido à base de cálculo da CSLL na hipótese em que essa atividade não constitui objeto pessoa jurídica, não compõe o resultado operacional da empresa nem a sua receita bruta.

Dispositivos Legais: Lei nº 6.404, de 1976, art. 179, IV; Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, arts. 11 e 12; Lei nº 9.430, de 1996, art. 29; Instrução Normativa RFB nº 1.700, de 2017, arts. 26, 34, caput e § 1º, III, e 215, §§ 1º e 14.

Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep

REGIME CUMULATIVO. ATIVIDADE IMOBILIÁRIA. VENDA DE IMÓVEIS. RECEITA BRUTA. INCIDÊNCIA.

A pessoa jurídica que tem como objeto a exploração da atividade imobiliária relativa à compra e venda de imóveis está sujeita à incidência cumulativa da Contribuição para o PIS/PASEP, mediante a aplicação das alíquotas de 0,65% (sessenta e cinco centésimos por cento), em relação à receita bruta auferida com a venda de imóveis próprios, mesmo na hipótese de os imóveis vendidos já terem sido utilizados para locação a terceiros em período anterior à venda e, consequentemente, terem sido classificados no ativo imobilizado naquele período.

Dispositivos Legais: Lei nº 9.718, de 1996, arts. 2º e 3º, caput e § 2º, IV; Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12.

Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins

REGIME CUMULATIVO. ATIVIDADE IMOBILIÁRIA. VENDA DE IMÓVEIS. RECEITA BRUTA. INCIDÊNCIA.

A pessoa jurídica que tem como objeto a exploração da atividade imobiliária relativa à compra e venda de imóveis está sujeita à incidência cumulativa da Cofins, mediante a aplicação das alíquotas de 3% (três por cento), em relação à receita bruta auferida com a venda de imóveis próprios, mesmo na hipótese de os imóveis vendidos já terem sido utilizados para locação a terceiros em período anterior à venda e, consequentemente, terem sido classificados no ativo imobilizado naquele período.

Dispositivos Legais: Lei nº 9.718, de 1996, arts. 2º e 3º, caput e § 2º, IV; Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12.

Em síntese, a orientação da Receita Federal admite que os bens da conta investimento sejam reclassificados para o ativo circulante, de modo a se aproveitar a tributação antes referida sem que tenham que sujeitar à apuração do ganho de capital com a incidência mais gravosa. Segundo a orientação da Receita Federal, o ponto decisivo para que tal ajuste contábil seja feito é a definição do objeto social descrita no contrato ou estatuto social. Quando o objeto da sociedade contempla a atividades que estão relacionadas com a venda do ativo a ser reclassificado, é possível admitir tal reclassificação, afastando a incidência do art. 215 da Instrução Normativa SRF n° 1.700, 2017. No entanto, é preciso observar as condicionantes que a Solução de Consulta COSIT n° 07 de 2021 estabelece:

Entrementes, para tal interpretação o requisito fundamental é que o imóvel, a qualquer tempo, não tenha sido destinado à manutenção das atividades da pessoa jurídica ou exercidos com essa finalidade, tampouco que a obtenção de rendimentos tenha se dado de forma estranha às suas operações, inclusive no que se refere à manutenção do imóvel exclusivamente para valorização, pois, do contrário, possuirá natureza econômica e jurídica de imobilizado ou investimento, conforme o caso. Por exemplo, o imóvel que seja ou tenha sido utilizado como sede da pessoa jurídica caracteriza-se como ativo imobilizado e, portanto, o resultado positivo obtido com a sua alienação representará ganho de capital nos termos da legislação tributária, ainda que o objeto ou a atividade principal da pessoa jurídica seja a alienação de imóveis.

Concluí, portanto, que alguns cuidados precisam ser adotados quando se estiver constituindo uma holding patrimonial: (a) cuidadosamente definir o objeto social da pessoa jurídica; (b) zelar pela correta escrituração contábil de modo a extrair os melhores resultados e (c) cuidar da tributação de cada operação de compra e venda de imóveis para que se faça incidir corretamente os tributos devidos.

Íntegra da Solução de Consulta COSIT n° 07 de 4 de março de 2021.

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